Ações Possessórias

A posse pode ser configurada como o exercício de fato de poderes inerentes à propriedade (uso, gozo, disposição da coisa, direito de reaver a coisa, conforme o art. 1.228, do Código Civil). Por conseguinte, o possuidor que tem um direito sobre a coisa (direito real ou direito contratual) pode tutelar a posse com base neste, que se revela nos fundamentos jurídicos que amparam a pretensão de defesa da posse inserida em uma ação.
Assim, o possuidor que tem uma titulação da qual decorre o poder de fato sobre a coisa (ius possidendi) pode tutelar sua posse, indicando o direito que lhe dá guarida como causa de pedir, por intermédio das seguintes ações:

– Nunciação de obra nova, na qual se pretende que sejam afastados atos atentatórios à integridade da posse, com supedâneo nos artigos 1299 a 1313 do Código Civil – Do Direito de Construir e que tem por objetivo a proteção da propriedade;

– Ação demolitória, que objetiva uma obrigação de fazer (demolir) uma obra, tendo em vista sua iminente ruína ou porque a mesma está em desacordo com as determinações legais, fundamentada no art. 1280, do Código Civil, e que tem por fulcro a defesa da propriedade;

– Embargos de terceiro, que visam a tutela da posse e/ou da propriedade, em decorrência de atos jurisdicionais de constrição, podendo estar fundada na posse, na propriedade ou em ambas, de acordo com arts. 674 e seguintes do Código de Processo Civil;

– Embargos de retenção por benfeitorias, que veiculam a pretensão de o possuidor de boa-fé em obter a condenação daquele para o qual deve ter restituída a posse de um bem, no pagamento pelas benfeitorias necessárias e úteis realizadas na coisa alheia, podendo retê-la até o efetivo recebimento, nos casos de execução de título extrajudicial para entrega de coisa certa, de acordo com os arts. 1219 do Código Civil e 917, IV, do Código de Processo Civil;

– Ação reivindicatória, que tem como causa de pedir o direito de propriedade, e objetiva a recuperação da posse por aquele que a perdeu. Trata-se de ação real, que, segundo fórmula de Orlando Gomes, “compete ao proprietário não-possuidor contra o possuidor não-proprietário”.

– Ação publiciana, que objetiva recuperar a posse de coisa com fundamento na propriedade adquirida pela usucapião, ainda não declarada por sentença judicial. Nos dizeres de Rosa Maria Andrade Nery e Nelson Nery Jr., “(…) a publiciana é a ação que visa a retomada da posse por quem a perdeu, mas com fundamento no fato de já haver adquirido a propriedade pela usucapião, aquisição de fato… (…) É a ação ‘reivindicatória’ do proprietário de fato (…)”.
Essas ações não são ações possessórias em sentido estrito, porque as possíveis causas de pedir que comportam não se limitam à posse, pois podem estar fundadas em um direito real, um direito pessoal ou até mesmo em direitos resultantes das limitações legais da propriedade de outrem. Tratam-se de ações cujo fundamento jurídico não repousa, com exclusividade, no ius possessionis, ou seja, na posse, pela posse.

Somente as ações cujo fundamento exclusivo é a posse são consideradas, em nosso sistema jurídico, ações possessórias, eis que resultam de uma proteção especial que o possuidor desfruta.
A defesa da posse, por meio das ações possessórias stricto sensu, é relativa e circunstancial, “(…) sempre correlacionada à situação fática daquele contra quem se pretende uma tutela jurisdicional de proteção possessória”.

Por conseguinte, qualquer posse, independentemente de sua qualificação (se de boa-fé, ou de má-fé – arts. 1201 e 1202, do Código Civil-; se justa, ou injusta – art. 1200, do Código Civil), legitima o possuidor para a propositura das ações possessórias. Se esse possuidor terá êxito quanto ao acolhimento de sua pretensão, é este o mérito a ser analisado, considerando-se até mesmo que, se mais de uma pessoa se disser possuidora, provisoriamente, deve-se manter a que tiver a coisa, de acordo com o art. 1211, do Código Civil. Desta forma, a título de exemplo, se alguém encontra um terreno desocupado e fixa posse e, passado algum tempo, surge uma pessoa que se apresenta como verdadeiro possuidor do terreno e pratica atos de agressão contra o primeiro possuidor, visando a desocupação do imóvel, o possuidor que encontrou o terreno desocupado tem legitimidade para ingressar com ação para proteger sua posse, independentemente de se saber se é de boa-fé e justa. Se conseguirá obter o reconhecimento de sua pretensão, com a procedência de seu pedido, tudo dependerá de ser reconhecido que sua posse é melhor do que aquela fixada pelo agressor.

Assim, as ações possessórias comportam tão somente uma causa de pedir, qual seja, a posse, independentemente estar ou não amparada em um direito real ou um direito pessoal, tendo como pedido principal o da defesa da posse. Como ressalta Adroaldo Furtado Fabrício, “(…) a posse é protegida, inclusive na via judicial, por si mesma, como simples fato, sem importar o título dela (domínio, outro direito real ou direito pessoal). Aliás, casos há em que o possuidor alcança a proteção em face do dono”.

As ações possessórias em sentido estrito correspondem às ofensas referidas no art. 1.210, do Código Civil, o qual confere ao possuidor o direito de pleitear a tutela à posse, em face de três diferentes graus de ofensa à posse: esbulho, turbação e justo receio de moléstia. Respectivamente, essas agressões comportam:

– a ação de reintegração de posse;

– a ação de manutenção de posse;

– e o interdito proibitório, cujo procedimento especial está previsto nos artigos 554 e seguintes do Código de Processo Civil. Portanto, as ações possessórias estão relacionadas ao grau de violência que se pretende afastar.

A ação de reintegração de posse supõe ter havido esbulho, no qual há a perda da posse, em virtude de atos praticados pelo ofensor. Na ação de manutenção de posse tem-se a turbação, agressão em que não ocorre a perda da posse, mas resulta em prática de atos hostis, violentos, contra a posse. Por fim, o interdito proibitório exige haver uma ameaça, na qual se pressupõe ocorrer o justo receio de violência ao exercício de fato exercido pelo possuidor sobre a coisa. Nesta última, a violência é mais sutil do que nas demais, e corresponde a simples atos de incômodo à posse, mas que deve ser fundada em atitudes concretas.

Por conseguinte, na ação de reintegração de posse o que se pleiteia é a recuperação da posse perdida, enquanto na ação de manutenção de posse o pedido é o de que sejam cessados os atos de turbação (art. 1210, do Código Civil e art. 560, do Código de Processo Civil). Já o interdito proibitório visa a que seja assegurada a posse de iminente turbação ou esbulho, por meio de ordem judicial de não fazer, cujo descumprimento resulta em imposição de pena pecuniária (art. 1210, do Código Civil e art. 567, do Código de Processo Civil).